Code 8: Renegados – Parte II

12 ANOS 100 minutos
Direção:
Título original: Code 8: Part II
Gênero: Ação, Drama, Policial
Ano: 2024
País de origem: EUA / Canadá

Crítica

2.5

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Sinopse

Um ex-criminoso se une a um traficante para proteger alguém de um policial corrupto numa cidade em que pessoas com superpoderes são estritamente vigiadas.

Crítica

A continuação de Code 8: Renegados (2019) começa reafirmando as características heroicas do protagonista Connor (Robbie Amell). Depois de cumprir pena na cadeia, ele é assediado pelo traficante Garrett (Stephen Amell), mas prefere levar uma vida franciscana limpando um centro comunitário decadente do que voltar a trabalhar no (e pelo) submundo. Lembrando que no filme anterior Connor apenas aceitou virar marginal porque precisava ajudar a mãe doente que não tinha dinheiro para custear o tratamento. Então, esse mocinho antes encarado como um herói disposto a sacrificar a própria moral para salvar um ente querido em apuros agora é o mártir preso para salvar a pele de pessoas próximas e, ainda por cima, aquele que renega a criminalidade ao ter alguma margem de escolha. Para aumentar essa visão de Connor como o cavaleiro de armadura reluzente que se destaca numa sociedade caracterizada por conluios entre a força policial e a criminalidade, ele é colocado no caminho de Pavani (Sirena Gulamgaus), a criança desamparada após o assassinato do irmão pelos cães robóticos apresentados à população como solução não letal à criminalidade. Lembrando que nesse universo cerca de quatro por cento da população têm superpoderes, justamente a parcela explorada da sociedade. Jeff Chan constrói situações arquetípicas entre bem e mal enquanto patina no desenho coletivo.

Code 8: Renegados – Parte II é uma ficção científica esforçada, relativamente bem-sucedida como entretenimento escapista dotado de algum teor de crítica social. Nela, Connor deseja se afastar do tráfico da droga sintetizada a partir do líquido espinhal dos Empoderados (como são chamadas as pessoas que nasceram superpoderosas). Ao assumir a defesa da menina que tem um dom raríssimo, ele se vê no meio de uma disputa interessante: de um lado, o traficante Garrett, alguém que jura atuar em prol do bem-estar social dos Empoderados ao garantir dignidade aos doadores de material para a fabricação da droga; do outro, King (Alex Mallari Jr.), o sargento à frente das operações policiais, aquele cuja imagem de exemplar guardião da lei serve para esconder da comunidade a continuidade de uma política de contenção agressiva. O roteiro assinado por Chris Pare, Jeff Chan, Sherren Lee e Jesse LaVercombe propõe um cenário interessante no qual a polícia se aproveita da sua posição como mantenedora da ordem para constituir um poder paralelo que inclui a proteção ao tráfico visando enriquecimento ilícito. Nesse universo em que ninguém fala do governo, do Estado propriamente (o que é muito estranho), homens e mulheres fardados são os patrulheiros, os contentores, os juízes e os executores. Mas, o realizador não utiliza as premissas do gênero para elaborar uma visão ácida.

A ficção científica foi muitas vezes utilizada como instrumento para oferecer visões críticas a respeito de elementos importantes das nossas sociedades. Não são poucos os exemplos dos filmes que apresentaram o pavor diante de invasões alienígenas como modo figurado de explorar o medo dos estrangeiros, do outro, ou seja, a ojeriza daquilo que não é familiar. No auge da Guerra Fria, eram comuns as histórias sobre vilões interplanetários e/ou monstruosos que facilmente podem ser lidos como metáforas de governantes dispostos a ataques nucleares para subjugar nações consideradas hostis. Pensando nesse sentido, Code 8: Renegados – Parte II tinha tudo para expandir a realidade proposta no filme anterior, no sentido de aumentar a associação entre uma sociedade fictícia sequestrada por quem deveria protegê-la e os indícios infelizmente cotidianos de brutalidade policial amparadas pela sensação de impunidade. No entanto, Jeff Chan trabalha essa sua visão crítica dentro de parâmetros muito seguros para causar qualquer impacto maior do que os limites da boa e velha luta entre mocinhos e bandidos deixam acontecer. Ele não evolui nessa conexão entre legalidade e banditismo, tampouco abre a visão para compreendermos a sociedade de Lincoln de modo mais amplo, fazendo uma avaliação superficial desse panorama. Sobram boas ideias mal aproveitadas encorpando lutas inofensivas.

Os roteiristas não colocam em jogo a liderança do Estado, das pessoas e poderes que estão acima da polícia (representado por ela? ludibriado por ela?). Code 8: Renegados – Parte II é ligeiramente inferior ao filme anterior, exatamente porque ensaia a construção de um discurso menos imediatista e mais consistente, mas acaba restringindo tudo à valorização dos heroísmos claros e maldisfarçados. Jeff Chan utiliza o preconceito aos Empoderados e sua miserabilidade como itens utilitários para direcionar a nossa torcida, nunca fazendo deles componentes de um discurso ácido embalado pelos preceitos estéticos e narrativos da ficção científica. Feitas todas essas ressalvas, o longa-metragem funciona dentro da ideia anteriormente citada de um entretenimento passageiro, na condição de um filme de ação com bons efeitos digitais (nada exagerado ou tosco, ainda bem) e domínio adequado dos códigos do cinema de ação. Um filme que poderia, perfeitamente, servir de guia para essa sequência se tornar mais do que apenas um programa divertido de 100 minutos é Robocop: O Policial do Futuro (1987). Nele, não apenas a polícia é enxergada como um braço ativo do Estado punitivo e agressivo, como também o sci-fi é utilizado como linguagem para estabelecer um curto-circuito entre o avanço tecnológico e a regressão da humanidade. Comparar os dois seria o mesmo que equivaler adultos e adolescentes.

Marcelo Muller

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