Godzilla e Kong: O Novo Império

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Ano: 2024
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Sinopse

Quando surge a ameaça colossal e desconhecida que ameaça a Terra e a Terra Oca, King Kong e Godzilla precisam unir forças novamente.

Crítica

Em mais um episódio fraco do chamado MonsterVerse, Godzilla e King Kong são novamente os grandes astros do pedaço. Tudo parece relativamente calmo depois do embate entre os titãs em Godzilla vs. Kong (2021). Kong explora o território vasto da Terra Oca enquanto Godzilla se transforma num protetor da humanidade, reaparecendo das profundezas sempre que surge outro monstro e depois tirando uma soneca no Coliseu, em Roma. Aliás, esse kaiju originalmente uma personificação do medo atômico – depois dos episódios devastadores da Segunda Guerra Mundial nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki – é retrabalhado dentro da tendência recente de transformar ameaças em soluções. Godzilla é monitorado pelas autoridades, mas como virou protetor, nem os mandas-chuvas se metem tanto assim com ele. Depois de mostrar Kong com dor de dente e melancólico na imensidão do novo habitat, por não ter uma família, Godzilla e Kong: O Novo Império dá uma colher de chá ao elenco e apresenta conflitos humanos. O principal deles é a falta de encaixe de Jia (Kaylee Hottle) fora da Ilha da Caveira onde foi criada se comunicando com o poderoso King Kong. Porém, o problema é simplesmente soterrado pela prioridade dada à ação, sobretudo aos titãs colocados em vigília pelo surgimento de um novo vilão. Os humanos se tornam apêndices da porradaria colossal e os titãs são antropomorfizados.

O êxito recente de Godzilla Minus One (2023) nos dá algumas pistas para compreender por que Godzilla e Kong: O Novo Império não passa de uma tentativa insossa de criar algo vibrante com personagens mitificados ao longo das décadas. Na produção japonesa, Godzilla é uma força selvagem e indomável, fundamentalmente ameaçadora, que pode ser lida como metáfora do sofrimento ao qual o protagonista destroçado pela guerra continua sendo submetido. Nesta nova tentativa de retratar um Godzilla americanizado, protetor dos fracos e oprimidos, o cineasta Adam Wingard sublinha as atitudes “humanas” dessa besta-fera irracional, sendo a principal delas uma disposição inabalável pelo heroísmo e a vontade de alimentar uma rixa com Kong. No entanto, é principalmente na construção do rei dos símios que o longa-metragem escancara essa antropomorfização. King Kong é lido a partir de gestos e comportamentos como os nossos, sendo o herói solitário disposto a tudo para salvar os necessitados, antes disso um titã vagando carente em busca de amor. Até Mothra, a mariposa gigante à qual recorre a antiga civilização quando as coisas parecem realmente feias, é concebida no filme como uma heroína iluminada que está ali para reparar os danos causados pelo mau. Então, em vez de abordar os titãs como forças incontroláveis de uma natureza agressiva, o diretor prefere ressaltar o que de humano eles têm.

Na premissa do mais novo exemplar do MonsterVerse, os roteiristas Terry Rossio, Simon Barrett e Jeremy Slater criam ameaças, sendo a principal delas a horda de gorilas gigantes liderados por um símio malvadão que, ainda por cima, escraviza uma espécie de Godzilla capaz de congelar os inimigos. É a situação perfeita para Kong novamente ser escalado como o salvador de uma humanidade enfrentando obstáculos muito maiores. De quebra, temos a reboque o Godzilla repaginado como respeitável guardião energizado pela radiação. Alternando cenas de ação sem um pingo de tensão e situações dramáticas que não garantem muito mais substância aos personagens de carne e osso, Adam Wingard faz um filme em que nada é tão importante. As preocupações de Ilene (Rebecca Hall) com a filha, o êxtase de Bernie (Brian Tyree Henry) por finalmente ter encontrado a Terra Oca, o jeitão malandro do Caçador (Dan Stevens) e a descoberta de uma civilização se tornam interlúdios esquemáticos entre os quebra-pau feitos em computação gráfica. Nem as lutas são eletrizantes, pois nelas não há ênfase nos movimentos, na intensidade dos golpes e na alternância do favoritismo. O realizador opta por planos próximos que, às vezes, embaralham visualmente ataques e defesas. Isso sem contar nas conveniências, que são utilizadas aos montes e coisas gratuitas, como as próteses que Kong ganha dos humanos.

Mais do que uma produção xoxa sobre titãs trocando sopapos e mães preocupadas em perder as suas filhas pré-adolescentes que podem falar com King Kong, Godzilla e Kong: O Novo Império é repleto de soluções providenciais que banalizam certos eventos. Num deles, quando Kong chega com o braço machucado, alguém se refere a um programa desativado que (pasmem!) era justamente sobre construir um membro mecânico para o guardião da Terra Oca. Não bastasse isso, o equipamento está a metros dali. Portanto, algo que deveria ser dramático se torna um obstáculo circunstancial por conta da utilização desavergonhada de um recurso milagrosamente oportuno. Soma-se a isso as exposições grosseiras que, de vez em quando, aparecem para esclarecer as coisas ao espectador – como quando a cientista lê um mapa na pedra que conta toda a história ou na vez em que o documentarista dita integralmente a sua interpretação para novamente não deixar qualquer dúvida. Outro problema é a quantidade de incongruências diante das quais somos convidados a fazer vista grossa. A principal delas diz respeito a Godzilla, citado como criatura em movimento incomum para atender ao chamado de alguém na Terra Oca, mas que mesmo assim precisa ser convencido por King Kong a descer. Então, o que ele estava fazendo reunindo tanta energia, se não era para isso? Nem a batalha final no Rio de Janeiro (que deve ter matado todo mundo do Arpoador até o Centro, no mínimo) é empolgante.

Marcelo Muller

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