Hamlet

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Gênero: Documentário, Drama
Ano: 2023
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Crítica

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Sinopse

Estudantes secundaristas se mobilizam durante o caos político do Brasil no ano de 2016. Diante de um iminente golpe de estado, o jovem Hamlet precisa enfrentar os fantasmas da vida adulta e encontrar seu lugar no mundo.

Crítica

O assunto não é novo. Quase uma década se passou desde as mobilizações estudantis de 2016, quando jovens secundaristas e universitários, de diversos estados do Brasil, ocuparam instituições de ensino e se manifestaram politicamente, visando barrar projetos considerados anacrônicos. Portanto, para além do cristalino – documentado em Espero Tua (Re)Volta (2019) e aclimatado em Derrapada (2022) – Zeca Brito, com Hamlet, transporta esse recorte aos campos filosófico e onírico, combinando gêneros cinematográficos. Proposta ousada e aliciadora, mas também de indispensável entrega emocional do espectador.

No acompanhamento da rotina dos envolvidos nos protestos, o ator Fredericco Restori, voz ativa das greves, é eleito pelo realizador como protagonista. Numa transmutação shakespeariana, Restori e Hamlet se unem para agir e refletir durante esse cotidiano extraordinário. Em sua idealização, o filme transporta a clássica dúvida do príncipe da Dinamarca, “ser ou não ser, eis a questão”, para um contexto de opções políticas. Ou seja, diante de um acontecimento histórico, no qual o jovem personagem principal está diretamente enredado, ele deve ou não abraçar causas? A partir daí, o livre arbítrio que compreende o “ser político” se torna o motor da empreitada. A sucessão de eventos funciona organicamente, muito pela capacidade de Restori em transitar sua interpretação entre o real e o ilusório. Esse trabalho fica explícito quando o próprio Zeca, manejando a câmera, é confrontado por uma repórter de um programa de factoides. Mesmo com essa situação improvisada, a roda continua a girar.

É claro que, diante dessa imersão vertiginosa em camadas filosóficas que visam originalidade, algumas circunstâncias soam como autônomas, sem estabelecerem conexão profunda. Tais construções podem ser conferidas em cenas solitárias de um contemplativo Hamlet. Mesmo que essas escolhas causem poucas perturbações às sugestões oferecidas, são cruciais para o inchamento da minutagem final.

Há ainda um bem-vindo espaço para debates entre narrativa e fato. Na época, frente à contestação das conjunturas tradicionais, houve choque entre mídia convencional e grevistas. Esse conflito de linguagens é bem examinado no longa, principalmente nas sequências em que há negociações de pautas entre estudantes e agentes da lei.

No fim das contas, Hamlet se sobressai não somente por sua clara inventividade, mas também pelas convicções que resistiram ao tempo. Há, aqui, um bom objeto de estudo no que se refere à cooperação entre ensino e sociedade, organizado em um movimento inferiorizado pela ascensão da extrema-direita que tomou conta do país nos anos seguintes, mas que vem ganhando potência sob as luzes do cinema.

Filme visto em agosto de 2023, durante o 51º Festival de Cinema de Gramado

Victor Hugo Furtado

Fanático por cinema e futebol, é formado em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Feevale. Atua como editor e crítico do Papo de Cinema. Já colaborou com rádios e revistas como colunista de assuntos relacionados à sétima arte e integrou diversos júris em festivais de cinema. Também é membro da ACCIRS: Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul e idealizador do Podcast Papo de Cinema. CONTATO: victor@papodecinema.com.br

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